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Governo Federal entregou títulos de regularização fundiária e assinou o Acordo de Cooperação Técnica com o Estado do Tocantins em 27 de junho de 2025, em Araguatins (TO), um marco para a segurança jurídica e aceleração da regularização de terras no estado. | Orla do Rio Araguatins / TO - (Foto: Cláudio Kbene/ PR) |
Análise da aprovação dos PLs 1294/2025 e 1664/2025 e seus impactos na postergação do georreferenciamento
Em meio a pressões de diferentes setores do agronegócio, do meio técnico e de especialistas em regularização fundiária, o Congresso Nacional tramita atualmente dois projetos de lei com objetivo convergente: prorrogar, mais uma vez, os prazos para exigência do georreferenciamento na regularização de imóveis rurais — os PL 1294/2025 e PL 1664/2025.
O PL 1294/2025 propõe estender por três anos o prazo para a realização do georreferenciamento de imóveis rurais, segundo tramitação recente nas comissões da Câmara. Já o PL 1664/2025 prevê alteração na Lei dos Registros Públicos para prorrogar a exigência de identificação georreferenciada em casos de desmembramento, remembramento e transferência de imóveis rurais — originalmente focado em lotes de até 25 hectares, o substitutivo aprovado ampliou o alcance da proposta em votação nas comissões.
A suspensão constante revela um paradoxo: enquanto países vizinhos avançam na adoção de sistemas modernos de cadastro territorial, o Brasil opta por flexibilizar regras e ampliar exceções. O resultado é um cenário em que a posse da terra continua prevalecendo sobre a prova técnica de sua medição, perpetuando sobreposições de registros, milhões de hectares sem cadastro confiável e comunidades inteiras fora do sistema oficial.
Associações de produtores rurais, especialmente de regiões com menor infraestrutura cartorial, defendem a prorrogação e apontam falta de estrutura técnica e recursos financeiros como entraves que justificariam o adiamento. Para esses grupos, a postergação evita o que classificam como “insegurança econômica” e possíveis bloqueios em cartórios que inviabilizariam operações como desmembramentos, transferências e obtenção de financiamentos.
Em contrapartida, agrimensores, registradores e especialistas em governança territorial criticam os adiamentos. Segundo esses profissionais, cada postergação enfraquece o processo de modernização cadastral e perpetua um cenário de insegurança jurídica, grilagem de terras e disputas territoriais, além do atraso na integração com o Cadastro Ambiental Rural (CAR), considerado essencial para políticas ambientais e de crédito.
“a certificação de imóveis neste país foi implementada aos poucos, tivemos 20 anos para nos adaptar, quanto registrei a Fazenda Shambala em junho de 2004 entendi que estávamos descortinando uma nova era … isso só foi possível por meio do georreferenciamento.”
“Desde 2015 nosso curso habilita nativamente o estudante para exercer a atividade de certificação de parcelas … temos pessoal qualificado, especialistas nesta área … os equipamentos estão acessíveis. Para ter uma ideia, a certificação de um imóvel de até 25 hectares é realizado no mesmo dia, em condições favoráveis, no passado seria em 3 meses.”
“Vejo um retrocesso na câmara dos deputados, eles não convidam profissionais da agrimensura para discutir o assunto … os deputados tomam decisões que muitas das vezes só favorecem uma minoria … podemos resolver isso com técnicas e profissionais habilitados … estamos dispostos a conversar … pois já fazem 24 anos da Lei do georreferenciamento … estamos à disposição para discussão.”
Se sancionadas, as propostas abrirão uma nova janela de tolerância — no caso do PL 1664/2025, a prorrogação até 2030 foi apontada como um dos possíveis efeitos — para que os proprietários se adequem ao georreferenciamento. Esse “fôlego legislativo” pode evitar prejuízos imediatos a produtores que enfrentam limitações técnicas e logísticas.
Por outro lado, existe um risco real de que o tempo adicional seja usado para adiar indefinidamente a consolidação de um cadastro territorial moderno. Historicamente, sucessivas prorrogações não resolveram completamente os gargalos estruturais. Sem articulação institucional, investimentos públicos e capacitação técnica coordenada entre INCRA, cartórios, institutos de ensino e conselhos profissionais, a postergação tende a postergar também a solução de conflitos e a insegurança jurídica.
O cenário ideal — segundo especialistas técnicos citados — seria aproveitar o prazo para implementar medidas estruturantes: financiamento público para regionalização de serviços de georreferenciamento, programas de capacitação em massa, integração de bases de dados e a participação formal de conselhos e associações técnicas nas discussões legislativas e regulatórias.
Com a aprovação nas comissões da Câmara, os projetos avançam para votação em plenário e, se aprovados, seguem para o Senado e posterior sanção presidencial. Resta a dúvida sobre o uso desse novo tempo legislativo: será uma janela para estruturar um sistema cadastral moderno e confiável, ou apenas mais uma prorrogação da dívida histórica do país com a regularização fundiária?